Não fui contente o suficiente
Das conversas que tenho, as mais bonitas têm sido com o meu filho.
Um conversador nato, com um raciocínio mais rápido que as palavras, atropelando-as sem dó nem piedade, só para fazer chegar ao outro o que está a pensar.
Com um sentido de humor salteado em sarcasmo, tão inesperado para os seus 11 anos, como outrora foi para os meus.
A propósito destas minhas conversas veio-me à memória outra conversa que não foi minha, mas de Clarice Lispector com um dos seus filhos.
Escreve ela que um dia antes do seu aniversário ele desabafa consternado "Mamãe, minha alma não tem dez anos."
Do alto dos seus ainda nove anos achava que os anos de vida se deviam contar pela alma, não pelo corpo.
Envelhecemos talvez, mais em anos de alma do que em anos de corpo, e esta ideia é ainda mais bonita, vindo de pés ainda tão pequenos, que se põem em bicos para chegar aonde muitos adultos não mereciam estar.
E dos seus tão curtos anos de vida, de alma envelhecida, confessava já vencido:
- Não fui contente o suficiente.